Foto do canto dos três andares da biblioteca de Sttutgart, na Alemanha, focando as estantes com livros e o sofá na cor azul. Uma biblioteca na cor branca e design contemporâneo.
Foto de Tobias Reich no Unsplash.

Letramento informacional de dados: Desenvolvendo um curso extracurricular

Francisco Foz
6 min readAug 30, 2022

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Criar um projeto de letramento informacional de dados é complexo, pois envolve muitas questões contextuais do ambiente organizacional e das pessoas envolvidas.

Continuando na leitura do livro:

“Data Information Literacy: Librarians, Data, and the Education of a New Generation of Researchers” (clique aqui para acessá-lo).

Caso você esteja chegando agora nesse texto, confira aqui a listagem dos demais.

O capítulo 4, trouxe o relato do projeto de letramento informacional de dados, desenvolvido na universidade de Cornell (EUA), para os alunos de pós graduação em “Recursos naturais e meio ambiente”, no formato de um curso extracurricular.

No texto de hoje, eu abordarei como foi estruturado o projeto e seus resultados.

Bora lá?!

GIF de uma mulher de cabelos loiros, cachecol xadrez nas cores vermelho e preto, jaqueta na cor bege e mochila nas cores cinza e vermelho, pegando um livro da estante, em um corredor de uma biblioteca.

Sumário

Contexto

Tópicos e desenvolvimento do curso

Resultados

Considerações finais

Textos anteriores

Contexto

O projeto foi implementado na pós-graduação de “Recursos naturais”, na universidade de Cornell nos EUA. A linha de pesquisa era o estudo dos peixes e zooplânctons do lago Ontário.

Foto da área externa da biblioteca de Cornell, focando a pilastra de um dos prédios e ao fundo o prédio principal com a torre do relógio, em um dia ensolarado com o céu sem nuvens e na cor azul.
www.cornell.edu

Devido as particularidades da área e da linha de pesquisa, os dados eram coletados e um determinado espaço e tempo e era impossível reproduzir as mesmas observações.

Este é um exemplo de um dado de pesquisa de origem observacional. Há outros tipos, no qual você pode ler mais na taxonomia de dados de pesquisa nesse artigo do Luís Sayão e da Luana Sales.

Esses dados ainda eram de enorme relevância, pois além de se terem informações coletadas de mais de uma década poderiam ser fontes de várias pesquisas entre diversas disciplinas. Necessitando assim de um adequado gerenciamento, curadoria e compartilhamento de dados.

A universidade já tinha uma iniciativa de suporte ao gerenciamento de dados, o “Research Data Management Service Group”, uma organização colaborativa que ligava docentes, discentes e funcionários na perspectiva de serviços de gerenciamento de dados à pesquisa.

Eram realizados diversos workshops sobre dados, como: estatística básica e temporal, coleta e análise de dados, orientação sobre sistemas de informações geográficas, bioinformática entre outras. Elas eram sempre mais focadas nas necessidades práticas dos laboratórios.

Entretanto ainda haviam lacunas e elas foram mapeadas durante as entrevistas e pesquisas realizadas. Elas foram:

  • Gerenciamento e organização de dados;
  • Qualidade e documentação de dados;
  • Metadados e descrição de dados;
  • Bancos de dados e formatos de dados;
  • Visualização e representação de dados;
  • Culturas de prática (compartilhamento de dados dentro da área).

Mas devido a priorização e autoavaliação da capacidade de atender essas necessidades, eles escolheram se concentrarem em:

  • Gerenciamento e organização de dados;
  • Análise e visualização de dados;
  • Compartilhamento de dados;
  • Qualidade e documentação.

Tópicos e desenvolvimento do curso

O projeto foi desenvolvido em duas vertentes principais:

  1. Oficinas na biblioteca: abordando vários tópicos de gerenciamento de dados.
  2. Curso extracurricular: de seis semanas para os estudantes de pós.

Os temas das oficinas foram:

  1. Planejamento de gestão de dados;
  2. Organização de dados;
  3. Documentação de dados;
  4. *Compartilhamento de dados.

A última oficina não ocorreu, pois teve uma baixa quantidade de inscritos, mas a equipe considerou que foi bem sucedido, pois para o contexto dos participantes, o tema estava ficando mais específico.

O curso teve um conteúdo semelhante as oficinas, entretanto com uma ênfase mais prática utilizando dados reais e vinculando diversas competências.

A cada aula, eles recapitulavam o conteúdo das anterior e tiravam dúvidas que surgiam.

Os tópicos do curso foram:

  1. Introdução ao gerenciamento de dados

Necessidades identificadas:

  • Introdução básica ao gerenciamento de dados.
  • Importância no contexto da pesquisa (público-alvo).

Resultados esperados:

  • Compreender o ciclo de vida dos dados.
  • Entendimento da relação de subconjuntos ou conjuntos de dados processados com os conjuntos de dados originais.

2. Organização de dados

Necessidades identificadas:

  • Gerenciamento e organização de dados no modelo relacional de banco de dados.
  • Documentação de conjuntos de dados.

Resultados esperados:

  • Compreender o conceito de bancos de dados relacionais.
  • Compreender quais formatos e tipos de dados são apropriados para as diferentes perspectivas de pesquisa.

3. Análise e visualização de dados

Necessidades identificadas:

  • Compreensão técnica da análise e visualização de dados.

Resultados esperados:

  • Ter familiaridade com o uso de ferramentas básicas de análise e visualização de dados (utilizaram a linguagem R durante o curso).

4. Compartilhamento de dados

Necessidades identificadas:

  • Compreensão da importância do compartilhamento e dos diferentes significados dos conjuntos de dados.
  • Compreensão do acesso de dados externos, encontrando e avaliando repositórios de dados.

Resultados esperados:

  • Reconhecer o valor que os conjuntos de dados podem gerar além do seu propósito original.
  • Saber localizar e utilizar repositórios de dados disciplinares.

5. Qualidade de dados e documentação

Necessidades identificadas:

  • Compreensão dos conceitos básicos de metadados.

Resultados esperados:

  • Compreender a lógica dos metadados e descrição de dados.
  • Saber como descrever conjuntos de dados de forma clara.
  • Desenvolver a capacidade de ler e interpretar metadados de outras áreas.
  • Compreender a estrutura e o significado das ontologias das áreas para facilitar o melhor compartilhamento de dados.

6. Conclusão final: Plano de gerenciamento de dados

Necessidades identificadas:

  • Desenvolvimento de um plano de gerenciamento de dados.

Resultados esperados:

  • Desenvolver um plano de gerecimento de dados.
  • Criar procedimentos operacionais para o gerenciamento de dados e documentação.

O projeto teve uma forma tradicional de ensino, com aulas expositivas, leituras e discussões de artigos e atividades práticas.

A forma de avaliação de cada sessão foi através de exposição de reflexões sobre o tema (durante a aula e no fórum), exercícios de aprendizado ativo entre os alunos e de autoavaliações.

Resultados

Os alunos e docentes gostaram bastante da iniciativa e o feedback foi muito bom!

Para entender os acertos e erros eles listaram os pontos fortes e fracos.

Pontos fortes:

  • Introduziu dos estudantes de pós-graduação a conceitos em gestão de dados.
  • Ensinou conceitos e ferramentas que podem ser utilizadas dentro e fora da academia.
  • Preencheram as lacunas na educação da pós graduação da universidade.
  • Construiu um relacionamento mais forte entre docentes, alunos e biblioteca.

Pontos fracos:

  • Ter mais exercícios práticos para que os alunos possam aplicar as habilidades que aprenderam aos seus dados de pesquisa.
  • Ter o foco em grupos menores, com pessoas do mesmo nível de experiência.
  • Ser um curso menos geral e mais focado.

Considerações finais

O curso foi um sucesso total. Vários alunos elogiaram e até mesmo falaram que gostariam de ter tido os primeiros contatos na graduação ou até mesmo no ensino médio.

“Curso ensina alunos de graduação a gerenciar seus dados.”

Título da publicação das comunicações internas do universidade.

A diversificadas habilidades com dados, a heterogeneidade das disciplinas e as rápidas modificações do mundo da tecnologia são desafios para pessoas bibliotecárias que queiram desenvolver e integrar as habilidades do letramento informacional de dados dentro do currículo de uma universidade.

O curso foi um teste realizado e os autores afirmaram que não conseguiam escalar ele para toda a universidade, pois seria necessários outros workshops e aulas mais direcionadas para cada área.

Pelo menos nessa primeira estrutura, no qual desenvolveram.

É importante percebermos o quanto foi um sucesso o curso promover o letramento informacional de dados para alunos e docentes.

Eu acredito que as bibliotecas podem ser protagonistas dentro de universidades para suportarem projetos como esse, facilitando o ensino e conectando pessoas na geração de conhecimento.

Pessoas bibliotecárias que atuam no mercado também podem promover projetos como esse, pois há uma necessidade muito grande das empresas em se tornarem “data driven”.

Para que haja de fato uma conscientização prática e técnica do uso dos dados, será necessário a “democratização dos dados”, o “letramento de dados”… o “Letramento Informacional de Dados”.

Agora me diga, você conhece algum projeto de letramento de dados/letramento informacional de dados em universidades ou empresas? Se sim, compartilhe aqui os links, materiais ou contatos para que possamos discutir mais sobre o tema.

Se você chegou até aqui e curtiu, dê palmas, compartilhe e se inscreva para me acompanhar.

Ainda há muito a se explorar…

Textos anteriores

Caso você ainda não tenha lido os textos anteriores, não deixe de conferir eles:

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Francisco Foz

Bibliotecário | Analista de dados | Disseminando informações para produzir conhecimento.